quinta-feira, 31 de outubro de 2013

E aí, macacada? Parte II (ou Quando d. Margarida pira)

Eu nunca chamei meus alunos de macacos. Nem de brincadeira. Quer dizer... uma vez eu disse: "Pare de guinchar, menino!"

Ah, e também já disse: "Vocês parecem cachorrinhos de apartamento que ficam cheirando a porta da rua, doidos para passear."

"Credo, professora. A senhora tá chamando nóis de cachorro?"

"Não. Eu disse que vocês estão agindo como cachorrinhos e não que vocês são cachorrinhos. É diferente."

"Só porque a gente quer ir ao banheiro..."

"Vocês sempre querem ir ao banheiro, mesmo quando não estão com vontade".

Uma vez, há muito tempo atrás, durante uma aula, um aluno chamou o outro de macaco. Imediatamente tomei as dores do garoto negro:

"E você, sua lombriga branquela? Se ele é um macaco, você não passa de uma lombriga branquela!"

Eu era inexperiente na profissão. Achei que estava fazendo algo certíssimo defendendo o menino que foi acusado de símio.

De vez em quando quebro o protocolo e levo para a sala de aula esses casos que acontecem entre professores e alunos e que viram notícias de jornal. "O que vocês acham?"

"Eu acho que o professor deu mole. Professor folgado. Se fosse comigo eu dava um pau nele. Processava." Eles dizem.

Em outras ocasiões, no auge da insubordinação geral, eu brado:

"Ai, que saudade dos tempos da palmatória!"

"O que é palmatória, professora?"

Eu explico. Eles concluem:

"Hoje é o aluno que bate no professor, não é professora?"

"E você acha isso certo?" Procuro estimular o debate.

"Tem professor que é folgado."

"Folgado como?"

"Chama a gente de 'pivete'. Fala que nóis é burro."

Sinto pena. E vergonha.

Lembro da minha tia avó que me chamava de 'macaca'. Para o bem e para o mal eu era uma 'macaca'. "Menina mais sem modos", dizia.E até hoje sou muito estabanada. Com as coisas e, o que é pior, com as pessoas.

 O que eu queria mesmo era ser uma boa professora, competente, confiável, adorável e amiga dos meus alunos o suficiente para poder dizer a eles com carinho e sem pejorar:

"E aí, macacada?"

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

E aí, macacada?

Li no jornal a notícia de um professor universitário do curso de Ciências Sociais de uma das melhores universidades do país acusado por estudantes de ter assediado uma aluna. Diz o professor que, ao ser interpelado pela aluna durante uma explicação sobre uma teoria sociológica, deu como exemplo um hipotético relacionamento amoroso entre a aluna e ele. Os coleguinhas da garota não gostaram e agora estão fazendo um escarcéu dos diabos. O professor foi afastado e o caso está sendo apurado pelas autoridades competentes.

Esse caso me fez lembrar de outro, também recente, de um professor de química (se não me engano) de  uma escola pública estadual que, segundo o jornal, se dirigiu à aluna da seguinte forma: "Se você fosse tão inteligente como é gostosa..."  A menina demonstrou seu constrangimento imediatamente. Imediatamente o professor caiu em si e pediu desculpas à aluna. Mas os pais vieram a saber do "sinistro" mais tarde e foram à escola no dia seguinte apurar o caso, com a imprensa a tiracolo.

Outro caso acontecido há algum tempo: um professor de ensino fundamental de um centro pedagógico universitário se ausentou da sala de aula por alguns minutos. Quando retornou, a bagunça era tanta que ele se dirigiu a um aluno comparando-o a um macaco. O mal-entendido tomou proporções enormes. Deu página inteira no jornal. O professor foi acusado de racismo pelos pais do aluno. Acabou exonerado, coitado.

O que está acontecendo?  Em quem acreditar? Nos professores ou nos alunos? Em qual contexto o professor chamou o garoto de macaco? Quão ofendidas as alunas realmente se sentiram? Até que ponto outros personagens tomaram as dores desses alunos? Quem está errado? Quem está certo?

Esses professores poderiam ser transformados em personagens da minha série "professores que piram", mas não vou fazer isso. A situação é mais grave. Tem clima de caça às bruxas. A sociedade exige do professor uma retidão monástica humanamente desumana. Já aos alunos, atualmente, permite-se tudo: eles podem plagiar e ou comprar trabalhos acadêmicos; eles podem mandar o professor tomar naquele lugar; eles podem depredar impunemente o patrimônio público; eles podem ser cínicos e desrespeitosos; eles podem usar drogas na escola...Eles podem tudo. O professor não pode nada. Ai do professor que sair do script e tentar improvisar um lado mais relaxado. Ai dele!

Não estou dizendo aqui que esses professores não erraram. Sei que existem várias versões dessas histórias. O que me assusta é pensar que uma simples palavra mal dita pode transformar a vida de um profissional em um inferno.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Show das Poderosas

Acabei de ouvir da minha filha de oito anos uma paródia da música  Show da Poderosas:

Prepara
Que agora
É hora
da aula de história
É chata
demora
A professora adora.

Fiquei sabendo que os coleguinhas dela não param de cantar essa versão.
E é por causa dessas e de outras histórias que eu penso que o Brasil é e sempre será "o país do futuro".

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

$ Não existe Educação de qualidade sem a valorização do professor $

E as manifestações do dia 15 de outubro? Eu esperava mais. Pelo menos, o discurso da mídia parece ter incorporado a necessidade de aumento salarial para os professores. Só isso já significa um avanço. Nos telejornais havia um discurso mais favorável a apoiar os professores na luta por melhores salários.

Todos nós precisamos agir para que a mídia troque o discurso de "mais investimentos para a educação" por um novo texto: "aumento salarial para os professores" ou "valorização salarial dos professores". Precisamos agir para conectar e fixar a ideia "salários baixos = educação de má qualidade". Se conseguirmos isso, ou seja, que a mídia incorpore e dissemine essa ideia, estaremos no caminho que realmente levará a alguma mudança.

Há algo que os sindicatos precisam levar em conta: sem o apoio da sociedade e da mídia não iremos a parte alguma. Os políticos precisam sentir que se não atenderem às reivindicações dos professores terão prejuízo eleitoral. Os professores deveriam agir no sentido de construir ações e ideias que ameaçem o conforto político de governantes e legisladores.

Já falei neste blog e repito: professores deveriam aprender a agir para tentar determinar o resultado de eleições através da união da categoria e da influência sobre seus alunos. No dia em que se chegar à conclusão de que o resultado de uma eleição (local ou regional) foi determinado (em parte ou no todo) por causa das ações de professores, pronto! Estaremos no comando!

E nós, do Reino da Província? E nós, caro colega, da República das Alterosas? O que vamos fazer para mostrar ao governo que não estamos mortos nem enterrados?

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Dia dos Professores

O que dizer, caro colega?
Vou lhe confessar uma coisa: detesto aquelas mensagens distribuídas em reuniões pedagógicas. Mensagens do tipo "se uma pedra de dez toneladas cair em cima da sua cabeça, sorria e mantenha o bom humor". Odeio esse tipo de mensagem! Elas são uma praga, uma epidemia que precisamos combater. Esses textos são nefastos pois ao invés de nos confortar, eles nos colocam ainda mais pra baixo pois são hipócritas! Chega a ser patética a lição de submissão presente nessas mensagens. Em quase todas, o subtexto é "se você está na pior, aceite o seu destino pois ser professor é uma missão, a mais digna de todas, e você é forte, é o mestre capaz de superar todos os obstáculos". Muito obrigada, eu dispenso esse tipo mensagem. Eu não sou Deus. Eu não sou Jesus. Eu não sou o Dalai Lama. Eu não tenho essa grandeza espiritual de aceitar tudo. Mesmo porque eu gosto de pensar em Jesus como um grande revolucionário. Por isso, caro colega, a minha mensagem  do dia dos Professores para você é uma mensagem de luta.

Não aceite. Lute.Questione. Informe-se. Mande a buRRocracia para o espaço. Participe. Mobilize. Manifeste. Reivindique. Faça valer o seu valor. E trate bem os seus alunos, pois crianças e adolescentes não têm culpa das incapacidades dos adultos de lhes oferecer um mundo decente. Eles são a parte boa dessa história, aquela que nos diverte, e para quem realmente trabalhamos, apesar de toda agressividade, apesar de toda violência, apesar de toda negligência.

Então, feliz Dia dos Professores!

sábado, 12 de outubro de 2013

Eu queria ser carioca

Eu queria ser carioca. Ser íntima da "cidade maravilha / purgatório da beleza e do caos". Lembro-me bem da minha primeira vez no Rio de Janeiro. Fiquei deslumbrada com a beleza natural e arquitetônica da cidade. Uma metrópole que inspira e transpira história, emoldurada por uma natureza exuberante. Uma natureza poluída, é verdade, mas capaz de extasiar a alma. E para todo lugar que se olha as fachadas despertam curiosidades e provocam surpresas.

E o povo? Aquela irreverência divina que deixa todo mundo sempre à vontade. Aquela criatividade inesperada que desafia preconceitos. Aquela malandragem estereotipada necessária à sobrevivência na selva de vaidades e desiguladades da Corte. O Rio é a Corte. Uma vitrine do Brasil para o próprio país e para o mundo.Um dos meus sonhos é morar lá. Um ano, no mínimo.

Como acontece com toda grande paixão, é claro que já me decepcionei com a cidade maravilhosa e com seus habitantes. Mas paixão vai e volta. E agora estou completamente encantada, de novo. Não é um acontecimento formidável as mobilizações dos professores que estão acontecento por lá?  Não é sensacional que a greve dos professores municipais esteja ganhando o apoio da sociedade carioca e que a categoria tenha conseguido levar milhares e milhares de pessoas às ruas? Ontem a justiça anulou a sessão de votação do plano de cargos e salários que o prefeito Eduardo Paes tentou impor à força.Para o dia 15 de outubro está prevista uma grande manifestação a favor da educação de qualidade e pela valorização salarial do professor.

E nós, caro colega? E nós aqui do Reino da Província? Da República das Alterosas? O que vamos fazer para nos salvar desse salário miserável e da destruição da nossa carreira?